Bullying. Qual o papel da igreja?

Após perceber uma mudança de comportamento em sua filha de 7 anos, que trocara sorrisos por introspecção nos últimos meses, o vigilante Weber Augusto ouviu da menina relatos que o abateram.

“Ela estava muito amuada, sempre num canto. Fui buscá-la na aula de ginástica artística e aproveitei para ir perguntando o que estava acontecendo. Descobri que os coleguinhas vinham rindo dela por causa do peso e do cabelo, que é enrolado – e lindo, por sinal!”. (08/05/14 GCN)

Outro garoto, de 10 anos, foi agredido ao sair da escola, violência esta motivada pelo simples fato do menino usar óculos. O menino, além das marcas físicas em seu corpo, carrega também o trauma psicológico do momento que passou. A mãe da criança, a dona de casa Valderez Dourado Soares, conta que ele foi espancado por outros meninos, todos maiores do que ele. “Bateram, pisaram e chutaram o meu filho. Até com um tijolo ele foi agredido”. Segundo a mãe, o garoto já havia sido alvo de agressões anteriores, causadas principalmente pela implicância dos outros estudantes com os óculos do filho. O menino, que além de apanhar frequentemente, também era submetido a violências de outras naturezas, como apelidos e humilhações constantes. “Já havia mais de um ano que ele apanhava no colégio. Além de baterem nele, ainda o chamavam por apelidos, como “quatro-olhos” e “jeca”, e isso o deixava muito triste”, relata a mãe. “Meu filho agora fica nervoso apenas em ouvir falar de escola. Diz que nunca mais vai voltar para lá. Ele é uma criança curiosa, mas muito tímida, que gosta de estudar. Agora não sei mais como vai ser…”. (29/10/14 G1.globo.com).

Cabelo enrolado, pouco peso, peso a mais, óculos… esses parecem motivos tão pequenos para tanto assédio e agressão, mas na verdade, não importa o pretexto, desde que se consiga intimidar, humilhar ou agredir alguém. Essa é a regra do “jogo”, chamado “Bullying”. Dramas como esses não são raros, infelizmente. São muitas as crianças e adolescentes que sofrem traumas pelas pessoas com que se relacionam e nos locais onde deveriam mais poder confiar. São ridicularizadas e humilhadas por características físicas, modo de falar, andar, se comportar, ou por qualquer outro motivo, simplesmente porque alguém decidiu que aquilo está fora da regra. Fazem da implicância com os que parecem mais frágeis, o seu passatempo; e pior, ganham os aplausos dos colegas e amigos, que admiram a coragem dos ofensores, tornando-se também seus coadjuvantes.

É comum uma criança que é desvalorizada e ridicularizada em casa ou que assiste agressões entres familiares, reproduzir essa atitude fora de casa, especialmente com aqueles que se assemelham com suas próprias fragilidades. No ambiente externo se comportam com valentia e tentam se afirmar dessa forma negativa.

As crianças e adolescentes precisam ser tratados com respeito e dignidade para que cresçam tratando o outro da mesma forma. Eles precisam ser orientados desde cedo, em casa, na escola e na igreja, a considerarem o outro e a aceitarem as suas diferenças. Se as crianças e adolescentes forem ajudados a perceber o outro como pessoa digna de respeito, a situação será outra nas escolas, nas esquinas, na vizinhança.

No dia 06 de novembro de 2015 foi publicada a Lei 13.185, que institui o Programa de Combate à Intimidação Sistemática (Bullying) em todo o território nacional. O Programa de combate ao bullying tem como objetivo prevenir e combater a prática da intimidação sistemática em toda a sociedade. Caracteriza Intimidação Sistemática como:

I – ataques físicos;

II – insultos pessoais;

III – comentários sistemáticos e apelidos pejorativos;

IV – ameaças por quaisquer meios;

V – grafites depreciativos;

VI – expressões preconceituosas;

VII – isolamento social consciente e premeditado;

VIII – pilhérias.

Está incluída aqui a intimidação sistemática na rede mundial de computadores (cyberbullying), quando se usa os instrumentos virtuais para depreciar, incitar a violência, adulterar fotos e dados pessoais com o intuito de criar meios de constrangimento psicossocial.

A lei 13.185 também classifica o bullying, conforme as ações praticadas, como:

I – verbal: insultar, xingar e apelidar pejorativamente;

II – moral: difamar, caluniar, disseminar rumores;

III – sexual: assediar, induzir e/ou abusar;

IV – social: ignorar, isolar e excluir;

V – psicológica: perseguir, amedrontar, aterrorizar, intimidar, dominar, manipular, chantagear e infernizar;

VI – físico: socar, chutar, bater;

VII – material: furtar, roubar, destruir pertences de outrem;

VIII – virtual: depreciar, enviar mensagens intrusivas da intimidade, enviar ou adulterar fotos e dados pessoais que resultem em sofrimento ou com o intuito de criar meios de constrangimento psicológico e social.

Precisamos avaliar as formas em que podemos contribuir para cessar os abusos contra o ser humano que foi feito à semelhança de Cristo.

Qual o papel da igreja?

Não podemos apenas esperar que tudo dê certo para as nossas crianças. É tempo de a igreja assumir seu papel de influência na sociedade, criando escolas de pais e ajudando-os a enxergar o efeito de suas palavras e atitudes na vida dos filhos. A família precisa ser orientada e ajudada para ensinar suas crianças e adolescentes a tratarem seus colegas com a mesma dignidade que esperam que seus filhos sejam tratados.

A igreja não pode ser ingênua e acreditar que ali não acontece esse tipo de agressão. Acontece, sim, e as equipes de professores precisam ser capacitadas. A igreja precisa abrir o debate sobre o tema, definir e implementar ações que previnam e tratem dessas situações.

A igreja, mais do que qualquer segmento da sociedade, deve participar de campanhas que promovam os direitos humanos, seguindo o mandamento de Jesus para amar o próximo.

A igreja deve se colocar no lugar de apoiar espiritual, emocional e juridicamente as crianças e adolescentes que sofrem bullying. A igreja não deve temer defender aqueles que se tornaram vítimas. Esse é o papel da igreja!

A igreja deve também oferecer ajuda aos agressores que precisam de compaixão, orientação, capacitação, tratamento. Levá-los à responsabilização, retratação e mudança de atitude.

A igreja pode usar seus meios de comunicação para divulgar e conscientizar a comunidade do problema e como preveni-lo e combatê-lo.

A igreja deve pregar a paz e levar seus membros de todas as idades a sempre escolherem o outro, a escolherem a paz, a escolherem o amor.

A igreja pode ser o canal de mudança de uma sociedade. A minha igreja e a sua igreja podem efetivar a Lei 13.185 porque existe uma Lei maior que estabelece o valor humano, com as suas diferenças, e sua importância. Essa Lei maior é a Palavra de Deus com os muitos ensinamentos de Jesus por meio de exemplos vivos, como quando chamou e deu atenção especial ao cego e mendigo Bartimeu, quando falou particularmente com os marginalizados Zaqueu e a mulher samaritana, e tantos outros. É isso que precisamos estar fazendo como Igreja de Cristo: amando e tirando as pessoas desse lugar de deboche e humilhação. Vamos?

• Clenir T. Xavier dos Santos é Diretora Internacional do Projeto Calçada/Associação Lifewords Brasil, membro da Igreja Batista e representante evangélica no CONANDA (Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente).

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